O Papel Estratégico das Polícias Institucionais e os seus desafios

Este é o quarto ensaio de uma sequência de artigos que, por iniciativa da Associação dos Policiais do Congresso Nacional, visa esclarecer e aprofundar questões históricas e jurídicas envolvidas na existência da Polícia Legislativa.

As polícias institucionais, sendo a Polícia Legislativa uma delas, ocupam um espaço singular no aparato de segurança do Estado brasileiro. Atuando de forma permanente em órgãos dos três poderes da República, essas corporações exercem funções que extrapolam a mera vigilância patrimonial, inserindo-se de modo cada vez mais relevante na proteção de autoridades, na prevenção de riscos institucionais e no suporte à governança democrática, sem dependência operacional de estruturas externas.

Nos ensaios anteriormente publicados, foram revisitadas as redações dos artigos art. 27, §3º, art. 51, inciso IV e art. 52, inciso XIII, da Constituição da República de 1988, bem como a inteligência da Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1988, que dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública, seus servidores e agentes políticos.

Também foram comentados, brevemente, os conteúdos da Resolução nº 13 de 25 de junho de 2018, do Senado Federal, da Resolução nº 18, de 2003, da Câmara dos Deputados, do Ato da Comissão Diretora do Senado Federal nº 15/2006, para defender que a ausência de menção expressa das funções da Polícia Legislativa na Constituição de 1988 não pode ser vista como óbice à sua criação.

Os ensaios apontaram que as Polícias Legislativas da Câmara do Distrito Federal, as Polícias Judiciais e do Ministério Público também não vêm expressamente previstas nos artigos 32, 96 e 127 do texto constitucional, mas foram criadas por Lei Orgânica (no caso do DF) e por resoluções próprias dos poderes.

Ainda, em um dos artigos, foi possível registrar que algumas Constituições Estaduais, como a Constituição do Estado de Goiás, em seu artigo 70, assim como Leis Orgânicas Municipais já vêm permitindo a criação das Polícias Legislativas Municipais, como é o caso dos municípios de Itapemirim (ES), Palmas (TO), Feira Grande (AL), Tucano (BA), Santo Antônio do Descoberto (GO), Valparaíso (GO), Itapissuma (PE), Rio das Flores (RJ), São Pedro da Aldeia (RJ), Mesquita (RJ), Rio Branco (AC), Parauapebas (PA), Tucuruí (PA), Porto Velho (RO), e Tibau (RN).

Assim, apesar de ainda tortuoso e sensível o caminho a ser trilhado pelas Polícias Legislativas, como polícias institucionais, vê-se que a categoria vem, aos poucos, ganhando seu espaço, sendo importante ressaltar que uma nova história das polícias no Brasil, sobretudo da polícia legislativa e da segurança pública institucional, apenas será possível quando sua função vier expressa no texto constitucional, isto é, quando houver reconhecimento da Constituição à sua altura, bem como quando esse reconhecimento estiver plenamente alinhado aos demais direitos e garantias que a própria Constituição consagra.

Nesse quarto ensaio, pretende-se discorrer sobre o papel estratégico das polícias institucionais e listar alguns dos desafios que ainda vêm sendo enfrentados.

1. Uma Função Histórica em Transformação

Historicamente, as polícias institucionais surgiram com um perfil voltado à proteção de edificações públicas, com foco na guarda do patrimônio físico e documental. Com o passar das décadas, entretanto, suas atribuições foram se complexificando, acompanhando as mudanças no ambiente institucional brasileiro, notadamente o aumento da violência política, as ameaças à ordem democrática e a sofisticada engenharia organizacional dos órgãos públicos.

Dessa forma, as corporações de segurança dos tribunais, das assembleias legislativas, das câmaras municipais e dos ministérios passaram a ser vistas como peças-chave para a manutenção da estabilidade institucional, sendo protagonistas em situações de crise e decisões estratégicas.

As polícias institucionais possuem atribuições que demandam elevado grau de tecnicalidade, discrição e comprometimento. Por essa razão, é inegável o seu papel estratégico: sua atuação não se restringe a aspectos operacionais, mas também abarca tarefas de análise de risco, formulação de planos de contingência, gestão de crises, investigações internas e controle de acesso.

O grau de especialização exigido dos agentes impõe a necessidade de formação contínua, com capacitações em diversas áreas como mediação de conflitos, tecnologias de vigilância, defesa pessoal, legislação institucional e ética funcional.

Esse arsenal de conhecimentos transforma esses profissionais em guardiões da institucionalidade, especialmente em ambientes sensíveis como os parlamentos, bem como todo o sistema de justiça.

Apesar da crescente complexidade de suas atribuições, a categoria ainda enfrenta entraves históricos e legais, conforme vem sendo demonstrado pelos ensaios publicados por essa Associação.

Entre os principais desafios, destacam-se a ausência de um marco legal nacional que reconheça e discipline de forma harmônica a existência das polícias institucionais; a falta de padronização nas estruturas organizacionais e nos protocolos operacionais; e a invisibilidade institucional junto aos demais órgãos de segurança.

Observa-se, ainda, a carência de investimentos regulares em aparelhamento, capacitação e condições de trabalho. Em muitas instituições, os agentes convivem com estruturas precárias, carência de armamentos adequados e baixa integração com as demais forças de segurança.

A ausência de um reconhecimento formal e normativo das polícias institucionais pode ter repercussões graves. A inexistência de um estatuto unificado fragiliza a identidade profissional dos agentes, dificulta a mobilidade funcional entre entes federativos e impede o estabelecimento de parâmetros mínimos de atuação.

Nesse sentido, projetos de lei e propostas de emenda à Constituição Federal que visam incluir as polícias institucionais como órgãos permanentes do Estado têm sido objeto de mobilização da categoria e de diversos parlamentares.

Entende-se que a aprovação de tais diplomas normativos representaria um passo importante para o fortalecimento da governança institucional e a segurança dos servidores e do cidadão.

Mais do que um aparato coercitivo, as polícias institucionais simbolizam o zelo do Estado pela integridade dos espaços democráticos.

Em momentos de tensão política ou manifestações sociais intensas, esses agentes são os primeiros a garantir a integridade física dos servidores e do público, bem como a regularidade dos trabalhos institucionais.

Sua atuação firme e técnica contribui para a pacificação de conflitos, prevenção de crimes e contenção de tumultos, sempre observando os direitos fundamentais e o respeito à legalidade.

Tal postura reforça a legitimidade das instituições e fortalece os pilares da democracia.

Para que as polícias institucionais alcancem seu pleno potencial, é imprescindível a consolidação de uma legislação nacional que reconheça sua existência, estabeleça diretrizes comuns e assegure condições dignas de trabalho. Além disso, é essencial promover o intercâmbio de boas práticas entre os entes federativos, fomentar o aperfeiçoamento contínuo dos agentes e ampliar o diálogo institucional com os demais órgãos de segurança.

O futuro das polícias institucionais está intrinsecamente ligado à evolução da democracia brasileira. Sua missão transcende a segurança física dos prédios públicos: trata-se de garantir a estabilidade das instituições e a proteção do Estado de Direito. Por isso, sua valorização é uma questão de interesse público e de fortalecimento da própria democracia.

Com o objetivo de garantir que cada cidadão brasileiro e cada cidadã brasileira conheça profundamente a Polícia Legislativa é que esse projeto de publicação de ensaios e artigos foi se tornando cada vez mais relevante, sendo que suas próximas edições tratarão mais especificamente acerca da segurança pública institucional, do papel, legitimidade

constitucional e os caminhos a serem trilhados para a consolidação das polícias institucionais, sobretudo da Polícia Legislativa, no Brasil.

Bárbara Nunes Ferreira Bueno[1]

Aylon Estrela Neto[2]

Vinicius Rodrigues Arouck Ferreira[3]


[1] Advogada, Professora e Pesquisadora. Mestra e Doutora em Direito Constitucional. Pós-Graduada em Direito Público. Pós-Graduada em Direito Digital. Convidada pela Associação dos Policiais do Congresso Nacional para publicar artigos que tratem das Polícias Legislativas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

[2] Sócio-Fundador do Estrela Neto Advogados;

Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (2013), pós-graduado em Direito Público pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (2016), formação complementar em Direito Digital pelo Insper (2017) e Master of Law em Direito Empresarial pelo Ceu Law School/SP (2023). Tem experiência na área de Direito há mais de 10 anos, com ênfase em Direito Cível, Empresarial e Digital.

[3] Vinícius Rodrigues Arouck Ferreira é Policial Legislativo Federal no Senado Federal, com especialização em Direito Penal e Processual Penal (IDP) e em Segurança Pública e Política Criminal. É professor orientador de prática penal, na área criminal e Tribunal do Júri. Atuou por quase uma década como advogado sênior e sócio em escritórios de destaque, com atuação em casos de grande repercussão nacional, incluindo Operação Lava-Jato, Zelotes e outros.

Publicado em: 22/05/25

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