CONCEITO DE SEGURANÇA PÚBLICA NO CONTEXTO CLÁSSICO E CONTEMPORÂNEO

O presente artigo visa analisar e compreender o conceito de segurança pública dentro do contexto contemporâneo de atuação dos órgãos de polícia institucional, haja vista o constante dinamismo que engloba a interpretação das normas e conceitos que circundam o referido tema, interpretação esta que busca acompanhar a evolução da sociedade como um todo e, consequentemente, das normas que a permeiam, visando os fins a que se destinam, em especial, os de busca pela paz social, ordem, segurança e bem-estar comum.

Nesse diapasão, é imperioso entender que o conceito de “segurança pública” não pode ser visto como um conceito engessado, concebido há décadas e fadado à imutabilidade, deixando de se levar em consideração a metamorfose social e, consectariamente, a devida e necessária transformação dos órgãos que compõem toda essa engrenagem. Esse desenvolvimento da sociedade e de suas instituições deve nos obrigar a, constantemente, reinterpretarmos as normas e os conceitos envoltos à sua órbita, haja vista que o Estado se encontra, diuturnamente, direcionado a uma busca evolutiva incessante em torno do fim de se construir uma sociedade estruturada, primordialmente, nos valores consagrados de justiça, de maneira a proporcionar, a todos os cidadãos, indistintamente, o pleno exercício da liberdade e da cidadania em sua integralidade.

Sendo assim, é de suma importância que todas as instituições encarregadas de promover esse bem coletivo estejam em permanente mudação, de modo a se aperfeiçoarem cada vez mais em prol da satisfação do interesse público. Nesse contexto, podemos aqui citar os “órgãos de segurança pública institucional”, a exemplo das Polícias Legislativas, as quais vêm crescendo significativamente nos últimos anos, principalmente no que se refere ao desempenho de suas atribuições constitucionais e legais, em perfeita consonância ao constante progressismo democrático-social e à fiel e irrestrita observância ao Estado Democrático de Direito e ao Princípio de Separação dos Poderes.

Nesse sentido evolutivo, esses órgãos devem perquirir, diuturnamente, uma atuação que seja cada vez mais pautada no princípio da eficiência, capilarizada e integrada com outras forças de segurança, visando, por conseguinte, a manutenção da autonomia dos Poderes e da ordem e paz inerentes, seja atuando no policiamento ostensivo juntamente com outros órgãos de segurança pública (a exemplo do que vimos no dia 8 de janeiro de 2023), seja atuando em ações de inteligência e de investigação – integradas, por vezes, a estes mesmos órgãos -, seja na proteção de autoridades, de servidores e de cidadãos em geral que estejam sob sua responsabilidade e monitoramento, como por exemplo, no caso de visitantes e manifestantes que frequentam diariamente as instituições dos Poderes Legislativo e Judiciário .

Em virtude do exposto, é preciso repensar significados e buscar progredir nos mais diversos aspectos relacionados ao aprimoramento das atribuições próprias dos referidos órgãos, almejando obter-se uma interpretação evolutiva de normas e conceitos congêneres, de maneira a tornar essas respectivas corporações, as quais desempenham atividades típicas de Estado, ainda mais atuantes na defesa dos princípios constitucionais envoltos, em absoluta sintonia ao avanço contumaz da sociedade contemporânea e aos ditames do sistema de segurança pública.

CONCEITO DE SEGURANÇA PÚBLICA NO CONTEXTO CLÁSSICO E CONTEMPORÂNEO

Antes de aprofundarmo-nos no estudo deste artigo, vamos, primeiramente, analisar três conceitos que bem definem o termo “segurança pública”.

Segundo Di Piero [1], “segurança pública seria a garantia dada pelo Estado de uma convivência social isenta de ameaça de violência, permitindo a todos o gozo dos seus direitos assegurados pela Constituição, por meio do exercício do poder de polícia”.


[1] MÔNICA MARIA COSTA DI PIERO, Desembargadora do TJRJ.

Conforme o ilustre professor Marcos Mandarini[1] (2005, p.13), podemos conceituar Segurança Pública como uma “condição de segurança provida pelo Estado, às suas expensas, mediante a utilização de instituições específicas de sua própria estrutura organizacional.”


[1] [1] MANDARINI, MARCOS. Segurança Corporativa Estratégica. Barueri-SP: Editora Monole, 2005, p. – 13.

Prosseguindo, de acordo com o conceito fornecido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “segurança pública seria um serviço público, baseado na prevenção e na repressão qualificada, com respeito à equidade, à dignidade humana e guiado pelo respeito aos Direitos Humanos e ao Estado Democrático de Direito”.

Portanto, vimos que os conceitos acima expressos praticamente se correlacionam. Sendo assim, mesclando as definições supracitadas, poderíamos definir a segurança pública da seguinte forma:

  • “um serviço público estatal com o fim de garantir uma condição de segurança e, por conseguinte, uma convivência social isenta de ameaça de violência, baseado na prevenção e repressão qualificada, com respeito à equidade, à dignidade humana e guiado pelo respeito aos Direitos Humanos e ao Estado Democrático de Direito, de maneira a permitir, a todos, o gozo dos seus direitos assegurados pela Constituição, por meio do exercício do poder de polícia.”

A partir dessa definição mais abrangente, se pegarmos, por exemplo, a Polícia do Senado Federal, e questionarmo-nos se essa corporação seria, também, integrante do sistema de segurança pública, bastar-nos-ia analisar as premissas supracitadas e então respondermos aos seguintes questionamentos:

1. A Polícia do Senado presta um serviço público que visa garantir uma convivência social isenta de ameaça de violência?

Sim, pois a Polícia do Senado Federal realiza a proteção de uma instituição pública em todas as suas vertentes, através de servidores públicos policiais concursados, objetivando que a atividade legiferante venha a ser desenvolvida isenta de ameaça de violência, seja intramuros, como por exemplo, ao garantir o livre direito de manifestação pacífica dentro das Comissões e do Plenário, ou, então, quando atuante em operações de controle de distúrbios civis nas áreas externas adjacentes ao Senado; seja extramuros, como por exemplo, quando garante o pleno e irrestrito exercício do mandato parlamentar de Senadores que estejam sob a sua proteção em deslocamentos nos territórios nacional e internacional.

2. A Polícia do Senado atua baseada na prevenção e na repressão qualificada?

Sim, pois ela atua tanto no policiamento ostensivo das dependências do Senado Federal e vias externas adjacentes, prevenindo a ocorrência de crimes, inclusive por meio de atuação conjunta com a PMDF quando em operações de controle de distúrbios civis; assim como atua também no policiamento repressivo, realizando a presidência de inquéritos policiais para a investigação de crimes que atentem contra bens, serviços e interesses do Senado Federal. Ou seja, ela possui atribuições similares às das Polícias Militares, assim como também a das Polícias Civis e Federal. Vejamos o artigo do RASF (Regimento Administrativo do Senado Federal) abaixo colacionado.

  • Art. 240. À unidade de Polícia do Senado Federal, dirigida por policial legislativo do Senado Federal, compete […] apurar infrações penais em detrimento de bens, serviços e interesses do Senado Federal ou praticados nas suas dependências; cumprir, em caráter privativo, os mandados de prisão, de busca e apreensão, as conduções coercitivas, a escolta de presos e de depoentes das comissões, quando estas diligências forem executadas nas dependências sob responsabilidade do Senado Federal; cumprir, em caráter privativo, as demais atividades típicas de segurança de autoridades e polícia legislativa; e executar outras atividades correlatas.

3. A Polícia do Senado tem sua atuação pautada no respeito à equidade, à dignidade humana e guiada pelo respeito aos Direitos Humanos e ao Estado Democrático de Direito?

Sim, até porque essas devem ser premissas de quaisquer órgãos de Estado, principalmente de órgãos policiais que lidam diariamente com situações as mais sensíveis possíveis.

4. A atuação da Polícia do Senado Federal tem o condão de permitir, a todos, o gozo dos seus direitos assegurados pela Constituição, por meio do exercício do seu devido poder de polícia?

Sim, a atuação da Polícia do Senado Federal tem o viés de assegurar vários direitos constitucionais, através da imposição de seu poder de polícia legal, entre os quais:

  • a) a autonomia do Poder Legislativo frente a possíveis interferências externas e o consequente resguardo da soberania popular advinda do voto popular;
  • b) o direito de reunião pacífica, por parte da sociedade, para fins de manifestação;
  • c) o respeito à integridade de pessoas que venham a ser detidas em virtude do cometimento de delitos que atentem contra bens, serviços e interesses do Senado Federal;
  • d) o respeito aos direitos dos presos, como direito a advogado e direito à comunicação imediata da prisão ao juiz e à família ou pessoa por ele indicada, direito ao silêncio etc.

Portanto, concluímos que, tanto a Polícia do Senado Federal quanto a Polícia da Câmara dos Deputados, assim como outros órgãos de polícia institucional afins, enquadram-se dentro dos conceitos retrocitados. Todavia, a atuação desses referidos órgãos, no escopo da segurança pública, acaba ocorrendo pela via indireta, haja vista que a sociedade é, na verdade, o interessado mediato  na atuação destas corporações, seja, por exemplo, quando da preservação do patrimônio institucional público, seja quando da proteção ao mandato parlamentar e à atividade legiferante correlata, porquanto o povo deseja ver o seu direito de representatividade devidamente exercido e livre de quaisquer interferências, em absoluto respeito aos Princípios da Soberania Popular, da Separação dos Poderes e do Estado Democrático de Direito.

Desse modo, visto e compreendido o conceito genérico de segurança pública, eis que podemos, hodiernamente, em respeito à constante evolução da sociedade e da interpretação das normas e conceitos pertinentes, dividir a segurança pública em dois ramos específicos de atuação:

a) Segurança Pública Geral (ou direta) – seria a segurança provida pelo Estado, às suas expensas, mediante a utilização de instituições específicas de sua própria estrutura organizacional, por meio de uma atuação que vise o interesse DIRETO da sociedade. Aqui se enquadram todos os órgãos listados no art. 144 da CF/88.

Ex.: quando um PM age em uma determinada ocorrência de roubo contra uma determinada pessoa, está ele, em sua atuação, representando o braço do Estado para atender diretamente o interesse daquele cidadão lesado.

b) Segurança Pública Institucional (ou indireta) – seria a segurança provida pelo Estado, às suas expensas, mediante a utilização de instituições específicas de sua própria estrutura organizacional, por meio de uma atuação que vise o interesse INDIRETO da sociedade. Aqui se enquadram as Polícias Legislativas e as recém-criadas Polícias Judiciais e do MP.

Ex.: quando uma equipe de proteção da Polícia do Senado Federal realiza a escolta de um determinado Senador em deslocamento no território nacional e internacional, ou quando as Polícias Legislativas Federais atuam em operações de controle de distúrbios civis na área do Congresso Nacional, tal atuação representa o braço estatal para garantir, em um viés imediato, a proteção do Parlamentar e da instituição pública em si, respectivamente. Na via indireta, essa atuação visa a garantia do interesse da coletividade, a qual deseja ver o seu representante livre para exercer o respectivo mandato e deseja que o patrimônio institucional público seja devidamente preservado, em todas as suas bases, para a devida consecução da atividade legiferante.

Sendo assim, ao atuar nesse vasto espectro de proteção a uma instituição pública extremamente relevante no contexto democrático, com todos as dimensões que lhes cabem (policiamento, estratégico e especial), as quais veremos adiante, concluímos que as Polícias Legislativas prestam, ao povo, um serviço de segurança pública de forma indireta, seja por intermédio da proteção irrestrita ao patrimônio público institucional, seja garantindo o pleno e livre exercício do mandato parlamentar através da proteção pessoal aos próprios Parlamentares, assegurando-se, por conseguinte, a devida manutenção da atividade legiferante e autonomia do Poder Legislativo, atendendo, dessa forma, ao interesse de toda a coletividade, em absoluto respeito ao Princípio da Soberania Popular.

PILARES (DIMENSÕES) DE ATUAÇÃO DOS ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA INSTITUCIONAL

Agora, passemos a analisar os pilares de atribuições das Polícias Legislativas, extensivos a outros órgãos de segurança pública institucional.

POLICIAMENTO

Tal dimensão, como o próprio nome já sugere, está diretamente ligada ao serviço de policiamento ostensivo e repressivo. No braço ostensivo, podemos citar o serviço de policiamento de áreas externas (adjacentes ao Congresso Nacional, no caso das Polícias Legislativas Federais) e o serviço de policiamento de Plenários e Comissões. No braço do policiamento repressivo, temos as atividades de polícia investigativa, mediante a realização de inquéritos policiais para o fim de apurar infrações penais que atentem contra bens, serviços e interesses das respectivas instituições, com o consequente cumprimento de mandados de busca e apreensão, de prisão e cumprimento de conduções coercitivas, a exemplo da Polícia do Senado Federal.

Importante salientar que, nesse pilar de atuação, os órgãos de segurança pública institucional agem, inúmeras vezes, em conjunto com outras forças de segurança nas vias externas adjacentes, em operações de controle de distúrbios civis, para o fim de garantir a devida proteção do patrimônio institucional público.

ESTRATÉGICO

Esse pilar diz respeito às atividades de inteligência (compreendida a contrainteligência) e assuntos estratégicos, tais como treinamento, logística, relações institucionais e apoio administrativo, englobando, ainda, nessa dimensão, o apoio técnico essencial prestado às CPIs/CPMIs.

ESPECIAL

Por fim, temos a dimensão que diz respeito à atividade de proteção propriamente dita. Nesse sentido, temos a seguinte divisão:

  • Proteção de dignitários (VIP): ambas as Polícias Legislativas Federais possuem, como atribuição de ofício, a realização da proteção diuturna de seus respectivos Presidentes em todo o território nacional e estrangeiro. Ademais, também realizam a escolta de Parlamentares e servidores em qualquer local, se assim designado pelo Presidente, a depender da análise de risco envolvida, além da proteção a dignitários que estejam nas dependências das Casas para fins de visita, reuniões, solenidades etc.
  • Proteção de pessoas em condição especial (PCE): pessoa em condição especial são as pessoas que não consideradas autoridades, sendo o caso de proteção a testemunhas, a presos e a servidores ameaçados.

Dessa forma, os Policiais Legislativos Federais atuam nos mais diversos rincões do país, além do exterior, desempenhando a função de proteção das referidas autoridades e servidores que demandem tal segurança, garantindo-lhes a devida integridade física, desde os grandes centros urbanos até os pequenos vilarejos e áreas de risco.

CONCEITO DE SEGURANÇA PÚBLICA INSTITUCIONAL

Se interpretarmos o conceito colacionado pelo CNMP, podemos concluir que a “segurança institucional” deve ser pautada na atuação seccionada em 5 (cinco) vertentes:

  • 1ª) dedicada à preservação do ativo humano (segurança de pessoas);
  • 2ª) concernente às medidas para a proteção das informações sensíveis tanto à Instituição, como aos membros integrantes;
  • 3ª) atinente à segurança do ativo físico predial (as áreas e as instalações);
  • 4ª) destinada à proteção do ativo físico móvel (os materiais);
  • 5ª) referente à segurança da imagem institucional.

Esse conceito genérico de segurança institucional pode ser aplicado tanto à segurança das instituições públicas quanto à segurança das instituições privadas. Nesse contexto, por essa avaliação superficial, poderíamos, tranquilamente, subdividir a segurança institucional em duas denominações: “segurança institucional pública” e “segurança institucional privada”.

Todavia, uma interpretação, digamos, mais voltada às premissas atuais e ao que concerne o conceito de segurança pública anteriormente analisado, a considerar, em paralelo, a evolução das normas, dos conceitos atinentes aos órgãos públicos e as transformações democrático-sociais, uma divisão mais racional e coerente, no sentido de chamarmos a atenção e separarmos o que seria “segurança pública” daquilo que seria “segurança não pública (privada)”, teria a seguinte denominação:

  • a) Segurança Pública – a segurança prestada a toda coletividade, subdivida em:
  • Geral – segurança pública prestada de maneira direta pelos órgãos elencados no art. 144 da CF/88.
  • Institucional – segurança pública prestada na via indireta pelos órgãos de polícia institucional.
  • – Polícias Legislativas;
  • – Polícias Judiciais;
  • – Polícias dos MPs.
  • b) Segurança Privada (ou não pública) – é a segurança feita a uma corporação (instituição) privada ou a um particular propriamente dito. Nesse sentido, podemos subdividi-la em:
  • – Segurança Privada Institucional ou Corporativa;
  • – Segurança Privada Pessoal.
  • Obs.: de acordo com a conceituação do ilustre professor Mandarini, especialista em segurança corporativa, a atividade de segurança teria a seguinte divisão:
  • Segurança Pública;
  • Segurança Não Pública – esta subdividida em “corporativa” e “privada”.

Visto as classificações acima e compreendendo a inteligência do termo “segurança pública institucional”, é cediço que há uma certa dificuldade em se estabelecer alterações relativas a certos paradigmas, uma vez que existem aqueles que têm as suas vaidades exacerbadas, e também aqueles que ainda se demonstram reticentes a aceitarem essas ditas evoluções conceituais (em virtude dos respectivos ônus que elas possam, porventura, trazer consigo), defendendo a não utilização da referida nomenclatura, de maneira a considerar, equivocadamente, o termo “segurança pública” como uma pecha que traz atrelada a si algumas mazelas infundadas.

No entanto, a meu ver, o conceito de segurança pública não pode ficar fadado a um engessamento clássico, haja vista que ele tem muito a agregar às corporações policiais institucionais, no que tange ao papel democrático dessas corporações no cenário contemporâneo, sendo preciso evoluir, repensar, rediscutir e inovar acerca de tais conceitos tradicionais, a considerar os motivos anteriormente explícitos e os a seguir expostos.

Prosseguindo em nosso estudo, primeiramente precisamos compreender que a responsabilidade da segurança, como um todo, de uma Instituição Pública, a englobar as 5 (cinco) vertentes anteriormente citadas, é realizada por servidores públicos policiais concursados, como por exemplo, no caso das Casas do Congresso Nacional, os Policiais Legislativos Federais, que se encontram a desempenhar atividades típica de Estado.

Dessa forma, se a segurança (proteção) de tais instituições é um dever de servidores públicos policiais, dever este voltado para, no viés indireto, a segurança da coletividade (segurança pública), que deseja ver resguardado a soberania do seu direito de voto em todos os seus alicerces, não há mister algum em denominarmos a atividade desenvolvida por tais corporações como: “Segurança Pública Institucional”.

Então, em razão de tudo que foi exposto até aqui, podemos chegar à conclusão de que a diferença entre “segurança pública” e “segurança privada” é que aquela é realizada visando garantir o interesse da coletividade, seja ele direto (segurança pública do art. 144 da CF/88) ou indireto (segurança pública institucional); e esta é efetivada para garantir o interesse privado (de uma instituição privada ou de um particular).

Adiante, iremos discorrer e analisar a atuação das Polícias Legislativas Federais no contexto dos atuais acontecimentos no cenário nacional político e compreenderemos, ainda mais, a questão que envolve o desempenho de tais forças de segurança no âmbito de aplicação da segurança pública direta e indireta.

ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA DIRETA (ART. 144 DA CF/88) X ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA INSTITUCIONAL

Como já discorremos acerca do conceito e subdivisão da segurança pública, em um contexto clássico e contemporâneo, podemos agora elencar os órgãos que compõem todo esse sistema. Primeiramente, cabe-nos relembrar que a “segurança pública” é:

  • a) um serviço público estatal;
  • b) com o fim de garantir uma condição de segurança e, por conseguinte, uma convivência social isenta de ameaça de violência;
  • c) baseado na prevenção e repressão qualificada;
  • d) com respeito à equidade, à dignidade humana e guiado pelo respeito aos Direitos Humanos e ao Estado Democrático de Direito;e) de maneira a permitir, a todos, o gozo dos seus direitos assegurados pela Constituição, por meio do exercício do poder de polícia.

Podemos constatar, através das características que definem o conceito de segurança pública acima transcrito, que nele se enquadram, perfeitamente, tanto os órgãos descritos no art. 144 da CF/88 quanto os órgãos de segurança pública institucional, a exemplo das Polícias Legislativas. A diferença reside no fato, como já visto, de que os órgãos do art. 144 da CF/88 prestam a segurança pública de forma direta à sociedade, seja na proteção imediata à coletividade, através da prevenção dos delitos, seja através da repressão qualificada aos crimes cometidos contra estes cidadãos. Já, os órgãos de segurança pública institucional prestam, tipicamente, um serviço de segurança pública de maneira mediata (indireta) à sociedade.

 Se formos mais a fundo ainda em nossa análise, ousaria dizer que os órgãos de segurança pública institucional também atuam, subsidiariamente, de forma imediata (direta), quando da prestação do serviço de segurança pública. Por exemplo, nas manifestações de novembro de 2016 ocorridas no Congresso Nacional, as Polícias Legislativas atuaram, conjuntamente, com a PMDF (assim como em tantas outras oportunidades), visando o controle do distúrbio civil ocorrido na área externa. Podemos dizer que essa atuação visava:

  • Diretamente, a proteção ao patrimônio institucional público do Poder Legislativo e;
  • Indiretamente, atender aos interesses da coletividade, por meio da preservação da autonomia do Poder Legislativo e a consequente garantia da Soberania Popular.

Todavia, ainda que, decorrente dessa ação em comento, a sociedade possua um interesse mediato, podemos afirmar que, pela via reflexa, essa atuação, precipuamente voltada ao controle do distúrbio civil, envolvia, diretamente, no caso concreto, a segurança pública dos manifestantes ordeiros ali envolvidos e que estavam contrários aos atos de vandalismo, apenas desejosos de exercerem o seu direito constitucional de reunião pacífica.

Nessa seara, quando da ruptura desse direito, em virtude da atuação de determinados grupos isolados, as Forças de Segurança (Polícias Legislativas Federais e PMDF) se viram obrigadas a atuar em conjunto para restabelecer a ordem e a paz, garantindo-se, por conseguinte, na via indireta, a segurança da sociedade que ali não se encontrava presente, mas que desejava ver o Poder Legislativo inviolável; e, na via direta, a consecução da garantia da segurança pública dos manifestantes ordeiros ali presentes, os quais apenas queriam ver seus direitos constitucionais respeitados.

Dessa forma, concluímos que tanto a segurança pública prestada de maneira direta quanto de forma indireta encontram-se umbilicalmente interligadas em diversos aspectos, razão pela qual o conceito de “segurança pública” clássico há de ser rechaçado, tornando-se extremamente necessário rediscutir-se e alinhar-se tal conceito às constantes transformações sofridas, principalmente no que tange às atribuições das Forças de Segurança como um todo, sejam elas integrantes do art. 144 da CF/88 ou de órgãos de segurança pública institucional, haja vista o constante dinamismo a que se submete a democracia e os conceitos a ela inerentes.

POLÍCIA DO CAPITÓLIO DOS EUA – U.S. CAPITOL POLICE – MUITO MAIS DO QUE UM ÓRGÃO DE SEGURANÇA INSTITUCIONAL

Continuando nosso raciocínio acerca do tema segurança pública, podemos trazer, para encorpar o nosso estudo, o exemplo da brilhante Polícia do Congresso Americano (U.S. Capitol Police), chamando a atenção para o fato de que eles também prestam um serviço de segurança pública tanto de forma direta quanto de maneira indireta à sociedade americana, seja atuando em operações de controle de distúrbios civis nos arredores do Capitólio ou efetuando o policiamento ostensivo das 200 (duzentas) quadras ao entorno de sua sede, seja atuando na proteção aos dignitários/servidores, em atividades de investigação e de inteligência etc.

Dessa maneira, a Polícia do Capitólio se traduz em uma força de segurança altamente capilarizada e em perfeita conformidade com os anseios contemporâneos de um país de primeiro mundo, fato que nos deve levar a repensarmos as funções de nossas forças e de seus conceitos e atribuições correlatos, se é que desejamos também, um dia, tornarmo-nos um país desenvolvido.

Importante salientar que a Polícia do Capitólio expandira relevantemente os seus poderes após os ataques de 11 de setembro de 2001, vindo a ampliar as suas atribuições, tornando-se uma das melhores forças policiais americanas, atuante em diversas frentes, tal como na prevenção a crimes urbanos no entorno do Capitólio.  Também ocorrera a criação de diversas unidades especializadas, sendo que hoje, a “Capitol Police” dispõe de vários segmentos: unidade aérea, policiamento com cães, motopoliciamento e policiamento ciclístico, além de também possuir uma unidade de operações especiais, entre tantas outras divisões.

                Portanto, a Polícia do Capitólio é uma corporação que, apesar de ter a missão precípua de garantir a proteção ao Parlamento americano, também atua no policiamento ostensivo de cerca de 200 quadras que cercam o Congresso dos EUA, com o fim de prevenir, de maneira imediata, a ocorrência de crimes urbanos locais e, consequentemente, a proteção mediata do Poder Legislativo.

                Dessa forma, traçando um paralelo à nossa realidade, em virtude de vários acontecimentos antidemocráticos recém-ocorridos (a exemplo do fatídico 8 de janeiro de 2023), torna-se imperioso que nossos órgãos de segurança pública institucional busquem, permanentemente, um aprimoramento profissional ainda mais significativo, com o subsequente aperfeiçoamento de suas atribuições legais, de modo a repensarem os respectivos modelos de atuação operacional, transpondo-se conceitos estagnados e, deveras, arcaicos, em prol da busca de uma melhor eficiência na prestação do serviço de segurança pública institucional no contexto democrático contemporâneo.

ORGANOGRAMA DO SISTEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA CONTEMPORÂNEO

Em virtude de todo exposto até aqui, com o consequente entendimento acerca da evolução das normas e conceitos atinentes ao sistema de segurança pública, uma vez compreendido que a segurança pública pode ser exercida tanto de forma direta quanto de maneira indireta, visando a salvaguarda do bem comum e o subsequente respeito ao Estado Democrático de Direito, eis que podemos esboçar o sistema de segurança pública de acordo com o organograma abaixo descrito.

LEGISLAÇÃO AFETA AOS ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA INSTITUCIONAL

Corroborando tudo que já foi dito até o presente momento, acerca da necessidade de releitura do termo “segurança pública”, nas acepções que lhe são cabíveis, em decorrência das constantes transformações sociais, do Estado e, na via reflexa, do papel de suas instituições, frente aos novos desafios impostos, eis que as legislações propositivas e definitivas atuais já estão levando em consideração o fato de serem, os órgãos de polícia institucional, a exemplo das “Polícias Legislativas”, corporações afetas à atividade de segurança pública.

Tal fato ocorre em razão de uma atuação, por parte desses órgãos, direcionada à sociedade de forma indireta, resguardando-se, de maneira imediata, o patrimônio público institucional e todos os seus tentáculos; e, na via mediata (indireta), a vontade soberana do povo, que deseja ver seus representantes livres de quaisquer interferências externas e o patrimônio público institucional preservado em todos os seus pilares para a consecução da atividade legiferante.

Dessa forma, iremos trazer agora, exemplificarmente, duas legislações pertinentes ao tema, as quais foram desenvolvidas em devida e perfeita adequação à nova concepção de “segurança pública”, em uma acepção mais racional e contemporânea, haja vista que os próprios legisladores estão tendentes a compreender a evolução do sistema como um todo, de maneira a reconhecer os órgãos de polícia legislativa como integrantes desse complexo sistema de segurança pública.

– Lei 13.675/2018 (LEI DO SISTEMA ÚNICO DE SEGURANÇA PÚBLICA):

  • Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e cria a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS), com a finalidade de preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, por meio de atuação conjunta, coordenada, sistêmica e integrada dos órgãos de segurança pública e defesa social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em articulação com a sociedade.
  • Art. 2º A segurança pública é dever do Estado e responsabilidade de todos, compreendendo a União, os Estados, o Distrito Federal e os Munícipios, no âmbito das competências e atribuições legais de cada um.
  • Art. 9º, §2º São integrantes operacionais do Susp:
  • […]
  • XVII – polícia legislativa, prevista no § 3º do art. 27, no inciso IV do caput do art. 51 e no inciso XIII do caput do art. 52 da Constituição Federal. (Incluído pela Lei nº 14.531, de 2023)

Ao interpretarmos a Lei que cria o SUSP, conseguimos extrair da norma que o Sistema Único de Segurança Pública tem, por fim precípuo, a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio público, fins estes que se encontram plenamente inseridos no escopo de atribuições das Polícias Legislativas (órgãos de segurança pública institucional), razão pela qual nos leva a concluirmos, indubitavelmente, que estes órgãos policiais desempenham um papel significativo dentro do arcabouço de segurança pública, servindo à sociedade, pela via reflexa (indireta), em virtude dos fatos aqui já apresentados e profundamente analisados.

– Lei 14.312/2022 (PROGRAMA NACIONAL DE APOIO À AQUISIÇÃO DE HABITAÇÃO PARA PROFISSIONAIS DA SEGURANÇA PÚBLICA)

  • Art. 1º Fica instituído o Programa Nacional de Apoio à Aquisição de Habitação para Profissionais da Segurança Pública (Programa Habite Seguro), como instrumento destinado à promoção do direito à moradia a profissionais de segurança pública, em observância ao disposto no inciso I do § 1º do art. 5º da Lei nº 13.756, de 12 de dezembro de 2018.
  • Art. 2º O Programa Habite Seguro é destinado aos seguintes profissionais de segurança pública:
  • […]
  • VII – policiais legislativos

Aqui, mais uma vez, o legislador reconhecera, notadamente, os policiais legislativos, como profissionais integrantes da Segurança Pública, fato que só tende a ratificar a acepção contemporânea do termo “segurança pública”, em seu viés mais profundo de interpretação, levando-se em consideração as variadas possibilidades de atuação em se tratando de segurança pública, seja pela via direta ou imediata – através dos órgãos do art. 144 da CF/88 – ou pela via mediata ou indireta – por intermédio dos órgãos de polícia institucional -, quais sejam, as Polícias Legislativas, que já se encontram plenamente consolidadas no ordenamento pátrio, e também, as recém criadas “polícias judiciais e do MP”.

CONCLUSÃO

Em razão de todo o exposto nesse artigo, levando-se em consideração a necessidade de se quebrar certos paradigmas, haja vista a necessária evolução do Estado e de suas instituições, não nos restam dúvidas de que o conceito de “segurança pública”, atendendo aos ditames sociais contemporâneos, precisa transpor as barreiras convencionais até então existentes, visando, por conseguinte, uma melhor prestação do serviço policial à sociedade, seja em sua esfera geral (direta) ou institucional (indireta).

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BIBLIOGRAFIA

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Autor

Jeferson Rocha dos Santos Junior
-Policial Legislativo do Senado Federal desde 2012, lotado
atualmente na Coordenação de Proteção de Autoridades;
-Ex PRF, de 2004 a 2012, tendo sido lotado na Baixada Fluminense;
-Ex militar das Forças Armadas (1992 a 2004)
-Bacharel em Letras e Direito
-Pós graduação em Políticas e Gestão em Segurança Pública e em Ciências Penais
-Instrutor de tiro, de abordagem Policial, de condução veicular
operacional e escolta motorizada de dignitários
Publicado em: 08/10/23

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